Não obstante os pesados prejuízos motivados pela escassez hídrica, falhas nos sistemas de abastecimento de água, no que concerne ao desperdício, contribuem para agravá-los. O Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto, relatório anualmente divulgado pelo Ministério das Cidades, destaca que, embora tenha-se avançado na redução das perdas, o patamar permanece alto. Enquanto nações como Austrália e Nova Zelândia amenizam os estragos nas etapas de distribuição ao consumidor para nível inferior a 10%, o Brasil ainda apresenta alto porcentual de 37%.
Além do frágil estágio de conscientização do consumidor em relação à importância de racionar o uso, são contínuos os prejuízos causados por vazamentos em adutoras, redes, ramais, conexões, reservatórios e outras unidades operacionais do sistema de abastecimento. Corrigir tais deficiências demanda muito mais que a expansão da infraestrutura. Depende também da modernização das técnicas aplicadas e do maior investimento em projetos para aperfeiçoar o gerenciamento dos equipamentos utilizados.
No relatório divulgado e referente ao desempenho de 2014, 15 Estados, incluindo o Ceará, registraram desperdício maior nas fases de distribuição ao consumidor em comparação ao estudo anterior. O mesmo levantamento do Ministério das Cidades constatou que 6,8% da população ainda não possui acesso à água encanada, embora 2,4 milhões de habitantes urbanos tenham passado a ser beneficiados com o serviço no período. Tal situação de desperdício crônico é quase um ultraje à penúria do líquido que acomete várias zonas sertanejas.
Ao mesmo tempo em que se tenta amenizar as falhas culpadas pelo crescimento das perdas hídricas na zona urbana, ampliam-se os efeitos desgastantes da seca no campo. A débil quadra chuvosa tem afetado as lavouras, preocupando os agricultores dependentes da germinação no plantio de milho e feijão. Em alguns municípios do interior, precipitações não acontecem há longo período, assim como estimou a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme). O último prognóstico da autarquia indica 65% de probabilidade de as chuvas ficarem abaixo da média.
O deslocamento do fenômeno denominado como Vórtice Ciclônico de Altos Níveis (VCAN) impediu a continuidade das precipitações responsáveis por banhar o Estado em janeiro, acentuando a situação crítica dos 153 reservatórios monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh).
A escalada da poluição nos açudes levanta outro obstáculo ao melhor aproveitamento da água. A Cogerh revela haver baixa qualidade da água em 48 reservatórios. A inexistência de estrutura adequada de saneamento básico torna usual o despejo de esgoto e dejetos nos mananciais, submetendo-os ao processo chamado de eutrofização, responsável por elevar o número de nutrientes e a quantidade de bactérias.
Deve ser prioridade estimular ações com o objetivo de reverter tais lapsos. Trata-se de responsabilidade compartilhada do poder público e sociedade. Na Grande São Paulo, os esforços conjuntos foram capazes de fazer o reservatório de Cantareira voltar a ser o principal sistema produtor de água. Após o êxito, o governo paulista reforça a importância de manter a conduta do uso comedido da água diante do risco de novo colapso hídrico. Tal diretriz precisa ser enfatizada até que se compreenda que a exploração desse recurso natural é finita.
fonte:http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/opiniao/perdas-em-meio-a-seca-1.1496569